Esta tarde a trovoada caiu
Pelas encostas abaixo
Como um pedregulho enorme...
Como alguém que duma janela alta
Sacode uma toalha de mesa,
E as migalhas, por cairem todas juntas,
Fazem algum barulho ao cair,
A chuva chovia do céu
E enegreceu os caminhos...
Quando os relâmpagos sacudiam o ar
E abanavam o espaço
Como uma grande cabeça que diz não,
Não sei porquê - eu não tinha medo -
Pus-me a rezar a Santa Barbara
Como se fosse a velha tia de alguém...
Ah! É que rezando a Santa Bárbara
Eu sentia-me ainda mais simples
Do que julgo que sou...
Sentia-me familiar e caseiro
E tendo passado a vida
Tranquilamente, como o muro do quintal;
Tendo ideias e sentimentos por os ter
Como uma flor tem perfume e cor...
Este poema foi escrito por Alberto Caeiro (heterónimo de Fernando Pessoa)